É mais difícil abrir uma conta, ou assaltar um banco???

Vamos por partes...

- Um dos meus rapazolas recebeu o primeiro ordenado.

- Pediu-me para ir com ele receber, pois tinha medo que o enganassem ou que algo corresse mal.

- Decidiu abrir uma conta à ordem, para ter o dinheirito seguro e poder movimentá-lo.

- Como trabalha no Forum e só sai às 15:00, lá fomos à Caixa Geral de Depósitos.

- Após algum tempo na fila, dizem-nos que o balcão vai fechar e já não têm autorização para abrir contas.

- Após alguma indignação, lá explicam que o balcão vai fechar definitivamente e não por serem 15:10.

- Aconselham-me a Loja do Cidadão.

- Lá chegámos.

- Seguramente uma dezena de Romenos (?) entre gritos, risos, correrias, algum ranhito pendurado, um ou outro lenço (caixené) na cabeça, umas barbas mal amanhadas e uns cabelitos bastante oleosos, deambulavam na zona, pois em frente à CGD é o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.

- Enfim chegou a nossa vez.

- Tudo a correr bem até que lhe pedem comprovativo de residência.

- Explico que se trata de um ex-utente da Instituição, temporariamente (espero) a residir num Centro Temporário de Acolhimento a Sem-abrigo.

- Com muita perplexidade, chama um colega, pois não entendia porque não apresentava uma factura de luz, água ou Tv Cabo.

- Lá explico ao colega, agora com mais um ou outro pormenor, embora tentando não comprometer ou estigmatizar o meu rapazola ali presente e entretanto com um nervoso visível no transpirar e tremer das mãos.

- Após algumas pesquisas (imagino eu) no monitor à sua frente, afirma que necessita de digitalizar um documento que comprove a morada e a profissão.

- Peço um e-mail ou nº de fax para que uma declaração possa chegar com a brevidade que as novas tecnologias permitem.

- Mais um caos. O sistema não permite abrir e-mails (um dia ainda parto a cara a esse tal de sistema. Não é por nada, mas não sei para que serve uma porcaria destas que em vez de existir para facilitar, apenas mostra insensibilidade, falta de humanismo e de soluções!!!).

- Já estava eu cheio de calma, quando me aparece esta personagem.

- A "cobra", minha Amiga e ex-docente (agora em funções muito superiores num balcão de serviços na Loja do Cidadão).

- Lá me disponibiliza o e-mail dela, embora a tecnologia por aqueles lados, andasse aos "repelões"...

- Bom, pelo menos a declaração de residência temporária já cá estava.

- Quanto ao comprovativo de profissão, expliquei que iríamos depositar um cheque precisamente passado por uma empresa onde o rapaz estava a fazer trabalho temporário (substituição de férias).

- Decididamente o entendimento (por causa do tal sistema, certamente), não estava a ser fácil e tive mesmo que elevar a voz e explicar num tom (à minha maneira) que era melhor abrir a conta com a documentação e informação que disponibilizámos, ou caso contrário, eu estaria ali até o balcão fechar a tentar explicar o meu ponto de vista e mais ninguém seria atendido.

- Claro que quem estava com a senha na mão (e com isto tudo já eram alguns), não gostaram da demora e lá foram pressionando "despache lá os rapazes", "vamos lá com isso", "é uma tristeza", "é só papelada e mais papelada"...

- A conta foi aberta!

Fiquei a saber que não se pode ser vagabundo, preguiçoso, sem-abrigo, trabalhador precário, nómada se queremos ter uma conta na CGD.

Fiquei a saber ainda que se alguém tem pouca experiência, alguma timidez ou dificuldades de comunicação e tenta fazer pela vida, para não depender eternamente dos outros, as portas custam muuuuito a abrir.

Talvez seja devido a "sistemas" como este que há tantas pessoas nas ruas e tantos outros sem declararem às finanças o que quer que seja.

Em situações extremas, estas situações, tudo menos humanizadas, podem levar algumas pessoas a não se importarem de vigarizar, afinal não estarão a fazer mal a ninguém, apenas a um tal de "sistema".