Pachos na testa, terço na mão
Uma botija, chá de limão
Zaragatoas, vinho com mel
Três aspirinas, creme na pele
Grito de medo, chamo a mulher.
Ai Lurdes que vou morrer...
Mede-me a febre, olha-me a goela
Cala os miúdos, fecha a janela
Não quero canja, nem a salada
Ai Lurdes, Lurdes, não vales nada.
Se tu sonhasses como me sinto...
Já vejo a morte, nunca te minto
Já vejo o inferno, chamas, diabos,
Anjos estranhos, cornos e rabos,
Vejo demónios nas suas danças
Tigres sem listras, bodes sem tranças
Choros de coruja, risos de grilo
Ai Lurdes, Lurdes fica comigo...
Não é o pingo de uma torneira
Põe-me a Santinha à cabeceira
Compõe-me a colcha
Fala ao prior
Pousa o Jesus no cobertor.
Chama o Doutor, passa a chamada
Ai Lurdes, Lurdes nem dás por nada...
Faz-me tisana e pão-de-ló
Não te levantes que fico só
Aqui sozinho a apodrecer
Ai Lurdes, Lurdes que vou morrer!...
António Lobo Antunes
3 comentários:
Como dizia o outro: "Avia-te, avinha-te e abafa-te!"...que com a Lurdes não te safas. As melhoras!
Avia-te - interpreto tipo "ataca um borreguinho assado no forno"
Avinha-te - interpreto tipo "carrega uns tintos caserinhos do Paraisal (Castelo Mendo)"
Abafa-te - interpreto como "com as castanhas, malha umas jerupigas, ou abafado"
A meu ver muitíssimo bem interpretado...
Dá-lhe gás.
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